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sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

escrever para quem?

… lembro a antiga convicção tantas vezes proferida, a do dever de redigir preferencialmente para quem não lê, para quem confessa não gostar de ler e profere nunca ter lido um livro do principio ao fim! Ora acontecia por essa altura em terras de Trás-os-Montes privava com um ilustre professor filósofo, e uma vez ouvindo-me ele proferir tal opção, discordando de que assim pensasse, olhando-me fixamente, disse: - Pois não deveria! para quê baixar a fasquia se a pode saltar mais alto?
Entendi o seu receio, o de sacrificar a qualidade. Ele alertava-me para o perigo do facilitismo - de escrever simples para ser lido e entendido pelos simples!
Mas pergunto, será que todos os que não lêem um livro o devem à estupidez?, não! Quantas pessoas não haverá que não são estúpidas e não lêem livros? talvez o motivo esteja do outro lado!, nos livros! e nos escritores!
O que não falta no mundo são livros escritos por ilustres sapateiros!, e aproveitando o vocábulo que aqui retrata o homem muitas vezes idoso coxo de uma perna, sentado na sua cadeira, num espaço exíguo a cheirar a cola, que com o seu alicate desprende as solas gastas, eu usaria a metáfora - os livros são como os sapatos! Há os que se ajustam ao formato do nosso pé e outros não!, acontece com os livros o mesmo, nem todos se ajustam ao tamanho do nosso espírito!,Quando encontramos um que nos fala não lhe somos indiferente!, pelo contrário levamo-lo connosco e falamos dele! Ainda assim creio ser raro este encontro ajustado entre um livro e um homem, mesmo quando eles se vendem aos milhares e os homens se contem em biliões! Há-os em mil tamanhos e para todos os gostos, a dificuldade é encontrarem-se o homem e o seu livro!, ora se me parece apropriado a quem quer ouvir falar de sapatos escutar a opinião de um sapateiro, não me parece menos que me escuteis se é sobre livros que quereis agora ouvir falar.
… eles têm sido a minha vida; deles em geral e de alguns em particular eu aprendi para acerca deles saber escrever!, escutei muitas vezes pessoas dizerem de livros consagrados inscritos na história da literatura universal, falo dos clássicos, o pior que se possa imaginar, como se tais livros fossem chatos pesados ilegíveis!, e afirmam-no! - Oh Esses livros não! - e por mais que sobre eles lhes dissesse maravilhas, demasiadas vezes senti a impressão que me ouviam como se lhes tentasse vender a banha da cobra! O erro era menos por querer dar pérolas a porcos, mas mais muito mais por não lhes saber transmitir de um modo verosímil a verdade…
… custa-me não saber defender o prestígio de um clássico!, mas hoje diria, o máximo a que um homem leitor, na literatura, pode aspirar é ao prazer de ler o Dom Quixote. Já no domínio da música não há como a música clássica, e dentro da musica clássica não há como Beethoven! Ora, e porquê Beethoven?, porque a sua genialidade me parece ser a mais difícil de refutar! Podem dizer das suas sinfonias: são demasiado pesadas, não as suportamos, com convicção até, mas creiam-me, mesmo até quem das suas composições mais não escutou do que o trecho do hino da alegria, achará que falais sem saber!, e só não se rirão de vós por respeito. Não é preciso ser-me muito inteligente para desacreditar da opinião negativa de um leviano sobre a música escrita por Beethoven, principalmente quando essa mesma opinião choca directamente com a fama ímpar da sua genialidade! Se há loucura que poderia medir-se neste mundo era a de se afirmar que Beethoven são sabia compor, Cervantes escrever e Caravagio pintar…
Escrever para os simples de um modo não simples e ainda assim conseguir captar-lhes a atenção não me parece processo fácil. Muitos dos simples sobre os quais podereis pensar que o são por confessarem não ler, na verdade, não enfermam de qualquer simplicidade; somente, não se excitam por qualquer coisa "insignificante" por dá cá aquela palha; mais que os letrados talvez queiram ouvir só quem lhes fala de facto! Quando isso acontece eles lêem. O fenómeno de granjear a leitura dos simples – concluíra - não se alcança baixando a fasquia, como receara o meu professor!,