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sexta-feira, 26 de março de 2010

Elogios como graos de areia - a refutação...

"os elogios...mesmo que bonitos e feitos para agradar...quando demasiados podem ser vistos como uma intrusão...para alguém que pode ser timido..."

A sua frase “bem todas as mulheres são bonitas” não a levei a sério… ainda assim me interroguei se haveria lido George Orwell, conclui depois que não, pois não vi escrito “mas há umas que são mais bonitas que outras”. Uma maneira de dizer que todos os animais não são iguais dizendo que são, é acrescentando: mas há uns que são mais iguais que outros.
Não sei em que terá pensado ou qual foi a intenção quando escreveu, “nunca fui alguém que crie ideias a partir de pessoas famosas...” li a frase 4 vezes mas não alcancei saber que género de ideias criadas a partir de pessoas famosas tinha no pensamento, se é que as havia.
Sim é um facto incontestável, as pessoas ditas famosas têm mais exposição. Agora que elas são mortais e estão sujeitas às imperfeições como as que o não são, também não é novidade, não há Deuses na terra!
Agora quanto a ser calmo e a ser contido nos elogios, para não serem vistos com uma intrusão, é assunto que a meu ver dá para uma tese de mestrado! Desde já lhe digo que não aconselho a ninguém a minimizar as suas virtudes para agradar a quem quer que seja. Elogios, desculpe contrariá-lo, nunca são demais. Se os elogios na terra pecam é mais pela falta, não pelo seu excesso. E a meu ver mais falta fazem às pessoas tímidas que às que o não são, uma vez que os elogios (a fama) prometem facilidades sociais… e abrem muitas portas… Quem elogia sem violar a ética de uma formação humanista, mesmo que seja em quantidades abissais, não merece reparo negativo, pelo contrário, elogiar é dar aos vivos o que outrora só os mortos colhiam em seus túmulos. Pasme-se mas o termo elogio vem do idioma Latim, elogium, “inscrição tumular; epitáfio; escritos que os vivos gravavam nas lápides em abono do bom nome, memória e honra dos seus mortos. Isso era chamado um elogium… talvez possa advir dai uma prova da dificuldade de elogiar - não era habitual - as pessoas desses tempos remotos precisavam de esperar toda uma vida para finalmente terem o seu elogium.
Se alguém os pensa ou vê como uma intromissão, que poderemos fazer? Minimizar a bondade do nosso coração? vamos deixar de dar nozes e pérolas? para não melindrar gengivas, manias, traumas e paranóias?? Admira-me esse discurso, «ai por favor pára como os elogios que me metes medo» – não os vemos depois a comprar um cão! – como é que os podemos levar a sério? - Quem não quer elogios que não abra páginas em redes sociais, vá fazer um exame à próstata, como o George Cloney afirmou preferir (a ter uma página no facebook).
Eu não sou famoso! Porém é raro o dia que não receba uma sms logo pela manhã com este dizer. Oi lindo! A pessoa que mo manda conheceu-me numa rede social, nunca nos vimos pessoalmente nem pela Web. Ora diga-me, acha que deva apresentar queixa na esquadra da minha residência por intrusão na esfera da minha vida privada? Sim decerto, se tivesse a mania da perseguição! Sei que os(as) há por ai com essas manias, não as(os) ouvisse eu no Ministério Publico na sala das diligências durante as inquirições…
De qualquer modo se o que conta é a intenção, obrigado. Se era para me normalizar os excessos para me conter a verve e a escrita desde já lhe digo que não vá por ai…

sexta-feira, 19 de março de 2010

O professor Bianchi

Um olhar azul claro e expressivo, de estatura pequena, quase franzina, cabelo loiro escasso, entrava na sala de aula, depois sentava-se em cima do tampo da mesa, cruzava as pernas e olhando os presentes fazia-nos entender querer o silêncio; e assim que este então se fazia ouvir interrompia-o - começara a dar a aula…
Na primeira aula se bem recordo, para se apresentar disse-nos que o seu maior defeito era a sua maior virtude - e vendo-nos com cara de querermos desvendado o mistério - revelou-o - Falo demais! De facto falava! Duas ou mais horas seguidas, que passavam depressa. Cedo em toda a Universidade o elegi como um dos meus professores preferidos – A sua eloquência, o seu vasto saber, o seu bom gosto eram admiráveis. E com o tempo somando momentos e visitas fui tornando-me próximo. Era uma pessoa pouco dada a demonstrações de afectividade, mas tinha um riso franco. Recordo-me de uma vez, subíamos um dos corredores da UTAD, ele dizer-me que eu lhe havia dado um dos melhores elogios que um professor pode receber, que assistir às suas aulas mais do que transmitir-nos o saber aumentava-nos a inteligência.
Por essa altura, eu contava uma anedota que havia lido num pequeno livro acerca de música, escrito pelo Maestro Vitorino de Almeida. Num fim de tarde contei-lha e tive pela primeira vez a satisfação de o ter feito rir. Em poucas palavras posso também contá-la a vós. Não sei se já viram pautas de música. Talvez já tivessem reparado existir nessas pautas palavras como, piano, pianíssimo, forte, fortíssimo! Pois é acerca delas, do significado delas, apesar de claro, poder ser erradamente interpretado a razão do riso desta anedota real. Aconteceu de facto algures numa sala com boas qualidades acústicas. Enquanto a orquestra ensaiava, o maestro que a dirigia interrompeu e exclamou: Forte! – Pediu depois que retomassem. Bateu com a batuta, os músicos encheram o peito e recomeçaram a tocar. Quando chegaram ao trecho onde tinham sido interrompidos, o Maestro voltou a interrompê-los e exclamou: Desculpem, parece que não entenderam, eu disse Forte! Fez-se silêncio. Os músicos olharam todos uns para os outros e tacitamente concordaram em mostrar ao Sr. Maestro o quanto o tinham entendido bem!, e todos se compenetraram. O maestro levantou a batuta e quando passaram pelo mesmo trecho os músicos tocaram com o máximo de força e fôlego. Todavia o maestro interrompeu de novo e de novo exclamou: Meus caros eu disse FORTE!, Desta vez um dos músicos indignado ousou responder ao maestro: Mas maestro nós já não conseguimos tocar mais Forte!, e responde-lhe o maestro: Eu pedi forte porque logo no início vocês tocaram fortíssimo.
O meu professor preferido rira-se desta anedota, e se bem recordo disse-me uma vez que já conhecia muitas pessoas e que não via grande razão em querer conhecer mais. Foi uma exclamação que batia de frente com os meus ideais. Sou daqueles seres, quiçá estranhos, que adora conhecer pessoas, por inúmeras razões… Mas porque me veio esta lembrança à memória? Por viver num mundo onde há tantas pessoas que fazem enorme questão em afastar da sua vida esta ou aquela determinada pessoa, e por ler um jornal esta entrevista com Helen Browns e  (por nos saberem a atravessar o luto da morte de um filho) “As pessoas com coragem vêm-nos perguntar se podem fazer alguma coisa, mas nós não queremos que façam nada, só que estejam ao nosso lado, queremos pessoas na nossa vida”. Curioso é reconhecer que aquelas pessoas de quem outras tanto fazem questão de se afastarem são as mesmas sobre quem outras tanto gosto têm em tê-las próximas! Concluo assim que a qualidade das pessoas é mais relativa que absoluta, e que não basta amar ou odiar esta e não aquela pessoa, é preciso saber o porquê e em nome de que ideal ou fim se ama ou odeia…
Mas acerca disso quem se auto-interroga?

quarta-feira, 17 de março de 2010

dias sem música

se o arrependimento matasse, por ter permitido esquecer-me nestes apressados anos da vida adulta de me entregar durante horas à ocupação que mais prazer me proporcionava nos meus tempos de adolescente, falo-vos das horas ligado à musica, já estaria morto. Nesse tempo escutava alto as sinfonias de Beethoven, as aberturas de Rossini, as fugas fantásticas de Bach, e alcançava assim as alturas – o céu sideral não poderia propiciar prazer mais elevado. Era a eternidade! O perfeito esquecimento de todas as verdades absolutas quanto à minha finitude - eu sentia neste mesmo corpo mortal a imortalidade! Sons ritmos e timbres em tão perfeita orquestração que eu pelo poder que tinha das apreciar na totalidade sentia como se o próprio criador daquelas obras fosse.

segunda-feira, 15 de março de 2010

um paradigma na chuva

Há duas maneiras distintas de sentir a chuva: quando se está abrigado e quando não. Para quem está confortavelmente sentado num sofá é cómodo opinar acerca da vida dos que se molham...
No interior de um edifício alto eu via chover copiosamente em todo pátio do Campus da Justiça. A chuva já havia alagado a relva e juntava-se no chão cimentado criando pequenos lagos e cursos de água. Chovia continuamente, como quando ouvia a minha avó dizer "só um doido anda lá fora como o tempo assim!!" A própria atmosfera alagada de humidade tornara-se quase opaca, mal deixava ver os vultos das duas pessoas paradas à chuva, uma atrás da outra. Uma, um homem debaixo dum chapéu-de-chuva grande e azul, atrás dele uma mulher mais jovem a ser fustigada pela chuva. O motivo: um telefone público.
A chuva é fria e escorre-lhe dos cabelos para o pescoço. Ela encolhe os ombros e inclina a cabeça para trás para a chuva não entrar, em vão. Conto 10 minutos de relógio, continua estoicamente no mesmo sítio… súbito passa um homem a correr como se a chuva o queimasse… A chuva cai agora mais forte mas nem uma palavra entre ambos… Alguém sabe como é que isto se tornou possível, normal, racional, humano mesmo?
Foi então que senti o desejo de associar tudo o que pudesse àquela situação insólita; a mulher preferia ensopar-se de chuva, enregelar, a interpelar um estranho.
Eu próprio, que outrora pedia uma boleia a quem quer que passasse debaixo do seu chapéu-de-chuva, hoje, a interpelar alguém, prefiro a chuva. Magoa fundo a rejeição de um estranho. Um ser que nos conhece pode alegar um motivo justificado. Já um estranho fá-lo gratuita e voluntariamente, e isso no meu entender é mais grave, porque trai a nossa esperança na humanidade. Despedaça a fé nas divisas humanistas, fazer o bem sem olhar a quem, quem dá a tempo dá duas vezes, entre muitas outras. Sente-se o desgosto maior…

sexta-feira, 12 de março de 2010

Mente Estável versus Instável - Aldous Huxley

"um homem capaz de sacrificar de ânimo leve um hábito mental há muito tempo formado constitui uma excepção. A grande maioria dos seres humanos não gosta e, na realidade, até detesta todas as noções com as quais não estão familiarizados. Trotter, no seu admirável Instincts of the Herd in Peace and War, chamou-lhes de «mente estável» e colocou em oposição a eles uma minoria de «pessoas de mente instável», apaixonados pela inovação em si própria.
A tendência do homem de mente estável, quer seja introvertido ou extrovertido, visionário ou não visionário, será sempre para verificar que «aquilo que está, está certo». Menos sujeito aos hábitos de raciocínio formados na mocidade, os de mente instável naturalmente que sentem prazer em tudo o que é novo e revolucionário. É aos de mente instável que devemos o progresso em todas as suas formas, assim como todas as formas de revolução destrutiva. Os de mente estável, devido à sua relutância em aceitar modificações, dão à estrutura social a sua sólida durabilidade. Há no mundo muito mais gente de mente estável que instável (se as proporções fossem trocadas viveríamos num caos); mas em todos menos em alguns momentos muito excepcionais, eles possuem o poder e a riqueza mais do que proporcional ao seu número. Daí resulta que, ao aparecrem pela primeira vez, os inovadores foram geralmente perseguidos e sempre escarnecidos como lunáticos e loucos.

Um herético, de acordo com a admirável definição de Bossuet, é aquele que «emite uma opinião singular» - quer dizer, uma opinião sua, em oposição a uma que já foi consagrada pela aceitação geral. Que se trata de um patife, não é preciso dizer. É também um imbecil - um «cão» e um «demónio», no dizer de São paulo, que profere «baboseiras vãs e profanas». Nenhum herético ( e a ortodoxia de que ele se afasta não tem necessariamente de ser uma ortodoxia religiosa; pode ser filosófica, ética, artística, económica); nenhum autor de opiniões singulares é alguma vez razoável aos olhos da maioria dos de mente estabilizada. Porque o razoável é o familiar, é aquilo que os de mente estável estão no hábito de pensar no momento em que o herege profere a sua opinião singular. Usar a inteligência de qualquer outro modo que não seja o habitual não é usar a inteligência; é ser irracional, delirar como um louco."

Aldous Huxley, in "Sobre a Democracia e Outros Estudos"
Acresce que os de mente estável por serem a maioria mais facilidade têm de se encontrarem - de se agruparem - de formarem alianças. Já os de mente instável, os criadores por serem em reduzido número menor probabilidade têm de se cruzarem com os seus iguais... pelo que, concluo, se tornam almas mais solitárias... mais expostas... sem a protecção do grupo...

quarta-feira, 3 de março de 2010

carta de um poeta (escrita na 3ª pessoa)

Venho humildemente dirigir-me a Vª Exª pelas razões seguintes…
tentei esquecê-la mas não o consegui de todo…
fi-lo como penitência pelas minhas faltas e desregramentos
mas não surtiu efeito
e na verdade eu mesmo não merecia afastar-me…
só me resolvi a isso quando notei que me tratou indelicadamente…
sou um artista da palavra e por isso merecia da sua parte mais respeito…
todavia venho à sua presença para que me reconsidere e me subtraia com a sua bondade do número dos renegados…
e que possamos ser amigos e conversarmos como conversamos nos raros momentos que nos aconteceram…
vi-a poucas vezes na minha vida, mas sempre que a vi olhei-a dos pés à cabeça e não existiu fio de cabelo que não lhe notasse…
eu merecia vê-la muito mais vezes mas parece que por uma qualquer lei maquiavélica quanto mais amamos um desejo menos ele se realiza…
pagamos muito caro gostarmos das pessoas…
mas o que me decidiu mesmo escrever-lhe é a quadra que se aproxima e indagar se Vª Exª sabe compadecer-se da dor alheia…

Obrigado meu Senhor

poderia eu alguma vez acreditar na existência do Deus dos Cristãos e dos Árabes dos Judeus e dos Protestantes e de todas as outras infindáveis comunidades monoteístas, vendo uma matilha de cães selvagens da savana africana a rasgar com as presas as entranhas dum gnu vivo a bramir a dor de olhos revirados no Inferno? 
oh quanto eu quero ácida a ironia - ó Deus eu lembro-te todos os doentes incuráveis do Instituto Português de Oncologia a serem devorados interiormente pelo inúmera diversidade de cancros e agradeço-te Deus todas estas provas de divindade e ainda rogo que se faça consoante a tua vontade. E agradeço: Obrigado meu senhor por podermos ver com repugnância os insectos a devorarem-se uns aos outros ainda vivos até à última antena, obrigado meu senhor pelos ataques dos lobos às vaginas das vacas a pastar nos prados, obrigado meu senhor por os Veterinários poderem testemunhar os efeitos irreversíveis desses ataques!, e seu abate ser depois obrigatório! Obrigado meu senhor também por todos os estropiados e mongolóides, sem esquecer as crianças que morreram e morrerão de poliomielite e fome, obrigado também meu senhor pela diversidade dos cancros das mamas, dos úteros, do pâncreas, dos pulmões, da pele e de todos os outros 1001 tipos de cancro, mil vezes obrigado. Nós não poderíamos nunca imaginar mundo mais perfeito e um ser criador mais misericordioso omnisciente e omnipotente, por tudo isto e por muito mais eu te dous graças por vosso imenso poder e vossa imensa glória!