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sexta-feira, 23 de setembro de 2011

as nebulosas que deixaram do ser e o efeito de Doppler que não ajudou

… 1 ano-luz designa uma medida - vai do ponto inicial de onde a luz parte até ao ponto último onde chega, decorrido a viagem de 1 ano. Para calcular quanto Kms a luz percorre em 1 ano, é preciso multiplicar o número dos segundos de 1 ano (60seg x 60min x 24horas x 365,25dias) pela velocidade da luz , (299792Kms/s). Estima-se assim que 1 ano-luz meça 9 460 000 000 000 Km. Se aceitarmos que a luz do nosso Sol nos chega com 8 minutos de atraso, facilmente calculamos a sua distância à Terra, 60seg x 8min x 299792Kms/s, isto totaliza 143900160 Kms.
1 ano-luz luz mede 65740 vezes a distância que nos separa do Sol.
Mas estes números que nos parecem grandes são de facto pequenos à gigantesca escala do Universo. Até ao ano de 1924 a comunidade astronómica acreditava num Universo que continha uma galáxia única, a nossa Via Láctea. Através de medições, equações e cálculos Shapley medira aproximadamente a galáxia num diâmetro de 100 mil anos-luz. E como não se avistava pelos Telescópios matéria fora da nossa galáxia acreditavam os astrónomos que o Homem havia conseguido medir o Universo – o qual abarcava no fundo pouco mais que o diâmetro da nossa galáxia, 100 mil anos-luz.
Aconteceu porém que, numa noite de 1923 de má visibilidade, um dos mais importantes astrónomos do Séc. XX, Edwin Hubble fotografou com o telescópio Hooker apontado para a nebulosa de Andrómeda um ponto tão luminoso que o intrigou, designou-o por N, a inicial de Nova. No dia seguinte com melhor visibilidade fotografou aquele diminuto cantinho do Universo de novo, conseguindo uma imagem de muito melhor qualidade. Desta vez viu mais duas estrelas Novas, mas depois de observar atentamente notou que uma delas era uma variável cefeide. E logo na nebulosa de Andrómeda. Era um achado. As cefeides permitem aos astrónomos medir distâncias. Agora Edwin Hubble podia saber a que distância estava a nebulosa de Andrómeda. O resultado foi inacreditável, estava a 900 mil anos-luz. Àquela distância Andrómeda adquiria o direito de não ser mais vista como uma nebulosa da Via Láctea – ela estava tão distante – e ainda assim era tão incrivelmente brilhante – porque era visível a olho nu – que tanto brilho só poderia provir de um sistema com centenas de milhões de estrelas – Andrómeda era afinal uma galáxia distinta tão magnífica quanto a nossa Via Láctea. De um Universo de aproximadamente 100 mil anos-luz passámos em 1923 para um 9 vezes maior; hoje com o uso de uma tecnologia menos rudimentar a escala do universo aumentou, descobriram-se galáxias a milhares de milhões anos-luz de distância.
Numa noite de céu limpo se evitarmos a poluição luminosa poderemos ver e dizer - o Universo é feito de estrelas brilhantes! – na verdade enganamo-nos. As estrelas estão tão distantes umas das outras que infinitamente maior que elas são os gigantescos vazios que as separam. O que predomina no Cosmos é o vasto e frio vácuo Universal, a noite eterna num espaço tão desoladamente aterrador, que comparativamente, os planetas e as estrelas, até os mais inóspitos e as mais distantes, nos parecem dolorosamente raros e encantadores.

… Os leitores sabem, sem precisar de ver, só pelo som que faz um carro a passar se ele se aproxima de vós ou se ao invés se afasta. Primeiro ouve-se um som cada vez mais agudo ao aproximar-se e depois quando já se afasta um som cada vez mais grave. As ondas sonoras são comprimidas no tempo pelo facto da fonte da sua origem (o carro) se aproximar, e quando o carro se afasta as mesmas ondas sonoras chegam-nos mais desfasadas, separadas por maiores intervalos de tempo. Este efeito é notório nas ondas sonoras, na sirene de uma ambulância que se aproxima, num carro de Formula 1, e nas ondas de luz como é? Se em vez de um carro fosse uma estrela a afastar-se de nós a sua luz não se alteraria pelo facto da sua fonte, a estrela, se afastar? Sabe-se hoje que sim, sofre um desvio para o vermelho. É o efeito de Doppler.
A equação deduzida por Doppler – depois aperfeiçoada - permite calcular quer a velocidade do emissor quer o comprimento de onda, uma vez que a primeira altera a segunda. Uma aplicação desta equação serve para um agente depois de disparar com o aparelho um feixe de ondas de rádio com um comprimento y - que regressará alterado - saber com precisão a velocidade do carro, - quanto maior o desvio maior a multa!
Aliás, houve até um astrónomo, que deu um inusitado uso à lei de Doppler; tentou ludibriar um polícia dizendo que não viu o vermelho, devido ao efeito de Doppler, explicando-lhe que, por se estar a aproximar, o sinal vermelho sofrera um desvio para o azul esverdeado. O agente acreditou e rasgou-lhe a multa por desobediência à sinalização, porém não o deixou ir embora impune, puxou da caneta e autuou-o, por excesso de velocidade.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

o frio gelava-nos as mãos

… as manhãs frias e as mãos enregeladas haviam ficado onde as deixáramos, e os caminhos das aldeias, pedregosos, ladeados de muros de pedra, só voltariam a ver-nos nas férias escolares de Natal.

- tu lembras-te que não conseguíamos atar os atacadores com as mãos geladas

- sim, era de uma dificuldade aliciante

… nas férias de Natal, quando acordava na casa da minha avó materna o frio do ar do quarto era o meu inimigo - sentia-o bem próximo - temia-o - para não ter que o enfrentar demorava a levantar-me – tudo estava frio – a camisa as calças e as botas – o frio não dava tréguas - obrigava-me a puxar os cobertores pesados até ao nariz – uma mão de fora do meu leito era um feito heróico - mas os sons do dia e a claridade da manhã, a primeira visão do quintal da minha infância, olhavam para a pequena janela - sabia impossível ter o dia de lá fora deitado – então depois de fracassadas tentativas e de tantos outros recuos, da vontade de me levantar - súbito afastava os cobertores e inspirando e expirando o ar assoprando-o - começava a vestir-me… Lesto chegava à cozinha e via a avó Carminda a bater com os punhos na massa dos filhoses de abóbora… A cozinha mais quente que o quarto estava perfumada pelo cheiro da massa dos filhoses contida no alguidar… Havia outros cheiros; o da lareira acesa a queimar troncos de madeira, o do gato Tirone que vinha secar-se da chuva junto à lareira, - uma vez ensonado pelo calor aproximou-se tanto que nem deu pelos bigodes se chamuscarem – custava aos meus olhos e aos do gato ver as labaredas quentes do fogo – ele fechava-os – evitava com isso afastar-se mais - a expressão do focinho irradiava prazer –
- Mete o gato la fora neto.
- Deixa-o estar, esta muito frio la fora...
- Coitadinho, pode-se constipar
O olfacto dele era melhor que o da minha avó - quando ambos estavam à lareira e eu tirava nas suas costas um chouriço do frigorifico – era automático o gato denunciava-me em segundos; primeiro com um miar esfomeado e depois rodando a cabeça na minha direcção.
- Livra-te de dar chouriço ao gato! -
Não era muito comum vê-los perto – estavam muitas vezes de relações cortadas – mais por culpa de minha avó que não lhe perdoava os furtos – tinha-o como um grande ladrão

- Ele sabe o mal que faz. Depois ter roubado o peixe aqui, de cima da mesa, ficou uma semana sem aparecer, para que eu me esquecesse. Aos meus pés não vem ele roçar-se.
- Mas avó roubar para comer não é pecado.
- Que vá aos ratos…
- Não se deixam apanhar…
- É um mandrião, um preguiçoso, a mãe dele era uma caçadora nata.
- Degenerou.

… os caminhos estreitos e pedregosos da aldeia eram em Lisboa avenidas largas e calçadas. Os pais e os nossos avós falavam-nos por cartas, e por vezes uma delas trazia algum dinheiro. Todos os fins de semana, com o pouco dinheiro que juntávamos, que dava somente para um bilhete, um de nós os quatro ia religiosamente ao Cinema para depois contar o filme aos outros. Não me custava nada ter que contar, aliás fazia-o por vontade. Mal ou bem todos, narrando-o, passávamos o filme aos outros, à excepção do mais gordo de nós, que contava todo o filme em três frases, uma narrando o princípio e as restantes o meio e o fim. Perdoámos-lhe a primeira vez, mas à segunda, depois da risada dele por nos contar o filme com meia dúzia de palavras, um de nós explodiu:
- Tu não sabes contar. Não vais mais na tua semana. Vai ele na tua vez (que era eu) que é quem de nós melhor sabe contar.

Uma vez riram-se muito por lhes ter retratado uma personagem que era uma sexagenária rica de pé no exterior do Aeroporto de Lisboa zangada com uma das suas duas caniches, uma de pêlo branco a outra de pêlo preto. A primeira estava sentada mas a segunda recusava-se a acatar as ordens da dona.
- Fénix vem aqui! Senta! Aqui! Ao lado da tua irmã!
A cadela mantinha-se onde estava como que a medir forças, e sem obedecer, olhava a dona de lado, face embora os ralhos…
- Fénix!! Senta! Aqui! Mas tu estás-me a ouvir?
Até o motorista do Taxi ouvia que estava longe e ela ainda lhe perguntava segunda vez
- Mas tu estás-me a ouvir Fénix?