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quinta-feira, 15 de abril de 2010

sobre a existência e a mudança

...deve haver palavras para a vida dos sentimentos decorrer como desejaríamos, ajudando-nos a adaptar-nos às incontornáveis mudanças; porém acontece que a nossa capacidade de leitura e interpretação dos sinais, revelados nas palavras e nos actos de terceiros para connosco, quando não são conforme à nossa vontade sofrem quase sempre uma distorção. Vemos e acreditamos o que já ninguém vê nem acredita. Queremos poupar-nos às mudanças incómodas que se exigem para com a verdadeira realidade, agarrando-nos à esperança de que tudo mude! Ora sabemos que para que tudo mude a solução passa exactamente por fazermos algo, porém, alienados, deixamo-nos como estamos esperançados que tudo vá mudar consentido que tudo fique na mesma…
Sem dúvida a felicidade do passado - quando a houve - aliada ao desejo da prolongarmos – sob o medo da perdemos – deve exercer sobre nós um grande domínio, uma grande dependência – a pontos de nos fecharmos quer para o mundo quer para o futuro – como se deles nada mais houvesse – julgam algumas pessoas assim porque pensam a ideia de futuro somente como uma continuação da vida do presente (do que resta dela). Mas os que não acreditam mais no passado, aspiram a, sofrem de, um desejo vital de uma nova vida…
dizer que tudo isto - pensar nas muitas mudanças a que a vida dos sentimentos obriga para depois se agir - não está intimamente ligado à liberdade que o nosso pequeno pecúlio nos possibilita é falso.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Pousada Paraíso, Salvador da Bahia

o velho índio-negro dono da Pousada Paraíso, sentado na sua cadeira de plástico branco, bebia tranquilo a sua cerveja enquanto mirava os transeuntes a caminho da praia. Vavá volta e meia rodava a cabeça e inclinava-se para a frente para poder ver as bundas das mais vistosas bahianas passar pleo meio do trânsito e da azáfama
- Olhe ai Português. Vocês não têm disto lá em Portugal.
Eu não respondia; andava apaixonado e tão desesperado que já nem pensava em ver outra bunda que não a da minha amada.
- Você anda preocupado Português. Você devia ir à praia de... tem lá muita mulher pelada.
- Onde é essa praia?
- Já está interessado né português... Você tá de carro?
- Não.
- A pé é mais difícil explicar. Tem que apanhar o autopic ou o mototaxi quem vai para Ipitanga...
Não era muito longe, mas eu como andava triste tudo me parecia longe.
Deixava-me estar na companhia do Vavá, atento às suas palavras....
- Que se passa com Você Português!! Qual é o seu drama?
- Tenho a minha amada e o filho aqui no Brasil, faz este ano três anos que não os via. Vim para os levar. Mas ela ora diz que quer ir ora me diz que não vai. Já não sei o que fazer para a convencer.
- Você faz-me lembrar um paulista que há uns anos passou por aqui pela pousada. Via-o sempre cabisbaixo e pesaroso a beber cerveja, sem falar com ninguém. As noites passava-as ai sentado; tomava muito café; pouco tempo ficava no quarto. Andava muito triste. Parecia doença. Até que um dia que lhe perguntei o que é se passava com ele... Não falou dessa vez, mas passado que foi um dia, enquanto bebíamos um suco contou-me que quando a mulher se decidira a sair de casa para se separarem de vez, vendo-o ela a chorar agarrado ao filho de cinco anos – falou-lhe assim - Porque é você está chorando por um filho que não é seu?
O índio Vavá mal acabou de contar rebentou num riso alto... Eu também me ri, apesar de não gostar de me rir da desgraça alheia. Pensei que altura mais macabra para saber a verdade; então comparei a desgraça dele, porque é esta a sina do Homem, comparar tudo com tudo, com a minha e quase me esqueci que sofria.
O meu sorriso desaparecia depressa, sem dar por isso afundava-o em pensamentos de medo. Talvez por isso Vavá continuava me contando as suas histórias…
- Você anda triste. Mas olhe não mude a sua natureza por causa dela. Conhece o conto do Mestre do aprendiz e do Escorpião? Dizem que escorpião queria atravessar o riacho que ia cheio e caudaloso. Então o mestre perguntou ao aprendiz se ele queria ajudar o escorpião. Quer? Quero! Ajude então. O aprendiz agarrou com cuidado o escorpião mas este sentindo-se agarrado picou-o tão dolorosamente que teve que o largar. Por três vezes ele tentou e por três vezes foi picado. Então porque a dor desespera o aprendiz decidiu não querer ajudar mais o escorpião - porque não merecia. Então o Mestre disse-lhe: merece sim ser ajudado. Não o julgue, a sua natureza é picar, como a sua é de ajudar, espero. Faça-o subir para cima desta folha de bananeira, assim ele não lhe pica. Ajude-o Use a inteligência, não permita que a natureza dele o fira… Não mude a sua boa natureza por causa da dele.
- Olhe Vavá, a minha natureza sempre foi a de ajudar, desde pequeno. Sou ateu mas deve ter-me ficado das aulas da catequese e dos livros... O que é que ela por vezes deixa-me tão desesperado... quando me compara com o ex., quando fala do que vai perder por deixar o Brasil... diz-me coisas que me magoam tanto...
- Talvez seja a natureza dela, magoar! Acha que deve também magoá-la?
- Nunca a magoei, nunca lhe bati! Só que por vezes, com os nervos, elevo o tom de voz, grito-lhe!
- Português, a gente não grita para quem ama!
Fez-se um silêncio profundo. Deixei de ouvir a azáfama de tudo o que nos rodeava.
- Português quer um suco da maracujá?, Você precisa muito de tomar suco de maracujá, acalma muito os nervos. Não deve andar atrás dela. Faça como o pescador; quer pescá-la? Dê-lhe linha!!! Linha!!!! Se ela o escolheu, ela lá saberá porquê!!! Mostre-se mais seguro! Sem medo de a perder... vai ver que ela o procura... Com carinho a gente leva uma mulher aonde quer... até as levamos á lua!
- Levá-las à lua é o mais fácil!
e Vavá continuava falando... aproveitando a companhia de um ouvinte atento…
- olhe Português eu já vi uma coisa que Você nunca viu...
- conte lá Vává o que é que Você viu que eu ainda não...
- foi no dia em que eu acreditei na ciência. Eu era crente, só acreditava em Deus... a ciência eu não compreendia por isso, eu duvidava. Ainda hoje eu não entendo isso da ciência, mas acredito.
- A ciência é exacta!
- Pois foi por isso que eu acreditei... Quando eu era guri, há sessenta anos atrás já havia quem falasse da ciência, mas eram muito poucos; as pessoas começaram a passar umas às outras «Amanhã às 10 da manhã o dia vai virar noite», As pessoas riam, todas perguntavam como e poucas acreditavam... eu mesmo não acreditei... e porque é que tinha que ser às 10 horas? Porque é que tinha que ser às horas que a ciência dizia?? Você sabe??
- Era o destino...
- Mas eu vi no relógio! Aconteceu mesmo. Começou perto das 10 horas da manhã a escurecer, as galinhas subiram para o poleiro, começou a ver-se as estrelas, e às 10 horas certas fez-se uma escuridão que o povo temeu que fosse o fim do mundo... eu fiquei mudo... O dia tinha virado noite!
- Vává, foi um eclipse. Acontece quando a lua encobre a luz do sol...
- Foi o dia em que acreditei na ciência...

segunda-feira, 5 de abril de 2010

perdoa-me meu amigo e colega das letras Cesário Verde!

se pudesses ler as palavras inspiradas que se agarraram à minha pele como grãos de areia depois que me banhei na tua orla... mas recordas-te o que aconteceu quando corri para ti (como uma criança)?, contaste o número das vezes que te escrevi e concluíste que eram demais… e trataste logo de mo dizer para que eu parasse de correr… Talvez um passo vagaroso, um compasso lento, uma cadência quase mortal te dissesse mais… Querias o comboio dos sentimentos parado na estação, a aguardar! e fazia-te confusão o tráfego do meu aeroporto com aviões a partir e a chegar de cinco em cinco minutos… por isso, assustada, quem sabe se com medo, achaste que era demasiado!, mas não é exactamente assim que são julgados os génios, as suas vidas e as suas obras! No filme Amadeus de Milos Forman, Mozart ouve com espanto acerca da sua peça musical: “Demasiadas notas!" e logo retruca: “E quer me dizer vossa Ex quais as que estão a mais?” Tudo o que os génios fazem parece ser ao comum dos mortasis em demasia!, como escrevem muito não são mais lidos! Pense-se em Marcel Proust!...
Quiseste virar a página e viraste-a de facto, mas sem a leres. E como a não leste não a viveste! (...)
...à hora em que passei na rua que sobe até à estátua do Fernando Pessoa, já era noite e vi (depois comecei vendo) caminhar à minha frente um casal de mão dada. Ele uma amostra de homem, ela uma perfeição. Decidi segui-la para ter a certeza de que era real e não uma aparição que acabara de entrar na Igreja. Um cão entra numa Igreja porque tem a porta aberta, mas porque entraria na Igreja um ateu como eu? Ora, por alguma coisa que valha a pena: por umas boas nádegas – desculpar-me-ão a rudeza da expressão – a verdade é que eram-no de facto, comprovava-se pela beleza do seu desenho, todo ele realçado pela justeza cingida da calça branca ajustada - sublime - até ouvi a voz de Deus!
- Ainda me negas? Depois de teres visto com os teus próprios olhos!
- «Foi um acaso, se soubesses a fórmula fazia-los todos iguais àquele! E haverias de ver como diminuiria a infelicidade na terra! As mulheres seriam melhor amadas e homens mais fiéis! Mas como é que sem saberes a fórmula ainda te arrogas de seres o criador de tão excelsa perfeição??, És é um grande charlatão!!!»
Infelizmente não pude continuar a cobiçar aquele quadro vivo de arte contemporânea por muito mais tempo, porque o meia-leca da hiena macho estava de guarda!, e ao aperceber-se que aqui o leão rondava a sua febra começou a rosnar, que é como quem diz, a olhar na minha direcção para me informar que me tinha topado!, Se uma alma de mulher deve ser amada, quer pela justeza das suas acertadas palavras e conselhos quer pelas suas boas acções, um lindo cu de mulher, porque é do que agora se trata, não o deve ser menos! Oh não morresse eu nunca e sempre visse e tocasse a perfeição das nádegas imateriais…